segunda-feira, 30 de maio de 2016

Vida póstuma, 1

Recordemos o exemplo dado por Walter Benjamin: a Revolução de Outubro repetiu a Revolução Francesa, redimindo seu fracasso, desenterrando e repetindo o mesmo impulso. (...) Assim, não só a repetição é o (um dos modos de) surgimento do Novo, como o Novo só pode surgir pela repetição. Naturalmente, a chave desse paradoxo é o que Deleuze chama de diferença entre o virtual e o real. 

(...) Somente a repetição faz surgir a diferença pura. Em sua famosa análise em Ser e tempo, quando Heidegger descreve a estrutura ex-estática da temporalidade do Dasein como o movimento circular que vai do futuro ao presente, passando pelo passado, não basta entender isso como um movimento em que eu, partindo do futuro (as possibilidades diante de mim, meus projetos etc), volto ao passado (analiso a textura da situação histórica em que fui "lançado", em que me encontro) e, daí, engajo-me no presente para realizar meus projetos. 

Quando caracteriza o próprio futuro como "tendo-sido" (gesewene) ou, mais exatamente, algo que é "como tendo-sido" (gewesende), Heidegger localiza o próprio futuro no passado - não, naturalmente, no sentido de que vivemos num universo fechado em que cada possibilidade futura já está contida no passado, de modo que só podemos repetir, realizar, o que já está presente na textura herdada, mas no sentido muito mais radical de "abertura" do próprio passado: o passado não é simplesmente "o que houve", ele contém potenciais ocultos, não realizados, e o futuro autêntico é a repetição/recuperação desse passado, não do passado como foi, mas daqueles elementos do passado que o próprio passado, em sua realidade, traiu, sufocou, deixou de realizar.

(Slavoj Žižek, Em defesa das causas perdidas. Trad. Maria Beatriz de Medina. São Paulo: Boitempo, 2011, p. 151-153).
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Heidegger openly violates the rules of the language only once; namely, at a most central point in the explanation he departs, in his linguistic renovation, from the grammatical system of the German language by using the form gewesende. The gigantic battle over Being really leads here to disruption: gewesen is a perfect participle; with this ending, however, it is used as a present participle and is made active. (Jan Aler, "Heidegger's Conception of Language in Being and Time". In: Joseph J. Kockelmans, On Heidegger and Language. Evanston: Northwestern University Press, 1972, p. 38) 
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Gewesenheit is a term coined by Heidegger from the past participle of the verb sein, meaning "to be", and the suffix -heit. Its literal meaning is "beenness". Heidegger uses the term to designate the existential concept of the past. The usual German word for the past is Vergangenheit, literally "gone-by-ness". Clearly, the neologism Gewesenheit is meant as a contrast to Vergangenheit. Wesen, which exists both as a noun meaning "essence" and as part of the conjugated forms of sein in modern German, is derived from the Middle High German verb wesen, meaning "to be", "to reside", or "to happen". The Middle High German verb is in turn derived from the Old High German verb wesan, derived in turn from the Gothic wisan, thought to be derived from the Indo-Germanic ues, meaning "to linger", "to live", "to spend the night". Heidegger avoids the use of Vergangenheit in order to emphasize that the past does not merely go by but continues to affect both the present and the future. Where we are and where we are going is always a function of where we have been. It has accordingly been thought appropriate to translate Gewesenheit as "continuance". (Richard Sembera, Rephrasing Heidegger: A Companion to Being and Time. Ottawa: The University of Ottawa Press, 2007, p. 193)
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(N12) GEWESENHEIT = VIGOR DE TER SIDO

A palavra alemã é uma derivação do verbo wesen que significa vigir, vigorar, estar em vigor. Como substantivo, Gewesenheit e seus derivados conotam a dupla experiência de uma força que já se instalou e que continua atuante. Por isso, a tradução optou pela expressão vigor de ter sido. (Heidegger, Ser e tempo. Parte IITrad. Márcia de Sá Cavalcante. Petrópolis: Vozes, 1990, p. 260.

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