sábado, 8 de dezembro de 2012

Crítica e hipermetropia

União Soviética, 1936
1) O que primeiro chama a atenção nos ensaios sobre literatura de Lukács são os pontos de referência escolhidos: Balzac, Tolstoi, Flaubert, Walter Scott, Goethe. Toda incursão de Lukács pelo século XX é feita em tom negativo. Ele escreve, no ensaio "Narrar ou descrever?": "O grau máximo alcançado pelo subjetivismo no romance moderno (Joyce, Dos Passos) coroa uma evolução que leva, de fato, a transformar toda vida íntima do homem numa fixidez estática e material" (Ensaios sobre literatura, 1965, tradução de Giseh Vianna Konder, p. 81).
2) "Narrar ou descrever?" é um texto de 1936, quando Lukács já estava empenhado em uma obstinada defesa dos valores soviéticos (a "riquíssima realidade do socialismo" como ele coloca, no mesmo ensaio, com uma ironia completamente involuntária). Monotonia, desilusão, fatalismo: é somente isso que Lukács vê nas vanguardas e na literatura que lhe era contemporânea - sua veemente recusa de Kafka e Thomas Mann é proverbial (ainda que tenha mudado um pouco de ideia quanto ao último com o passar dos anos).
3) Imediatamente liguei o campo referencial de Lukács àquele de Milan Kundera - são rigorosamente os mesmos autores, com a diferença que Kundera incorpora ainda Cervantes, Sterne e Stendhal. Mas se Lukács só tem olhos para o que está distante - e não aceita aquilo que lhe está presente -, Kundera, por outro lado, reconhece não apenas em Kafka, mas em Joyce e Hermann Broch, o clímax de procedimentos utilizados por aqueles escritores do passado - os mesmos lidos por Lukács (diante desse descompasso, poderíamos dizer que já não são mais os mesmos lidos por Lukács).

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